Oscar 2013: O amante da rainha


Indicado na categoria: filme estrangeiro


Para os desavisados, O amante da rainha aparenta ser apenas um típico romance de época, mas não se engane: o longa dinamarquês, inspirado numa história real, constrói sua narrativa aos poucos, com argumentos sólidos. Quando se dá conta, o espectador está diante de uma trama de amor impossível, digna da ficção, e de um momento único, nos aspectos político e cultural, na história do país. Se há mais liberdade poética do que o desejável, é difícil saber. Mas tudo faz tanto sentido que seria um pecado não ser de verdade.

A inglesa Caroline Mathilde (Alicia Vikander) se casa por conveniência com Christian (Mikkel Boe Følsgaard), rei da Dinamarca. Ela logo engravida, mas nem isso é capaz de sustentar o casamento, posto à prova diariamente pela suposta loucura do monarca. Quando ele decide passar um ano fora, num giro pela Europa, a corte busca um médico particular para acompanhá-lo. O escolhido é o alemão Johann Friedrich Struensee (Mads Mikkelsen), que ganha a confiança de Sua Alteza por ser capaz de citar Shakespeare, já que teatro é uma de suas paixões. Acontece que a presença do estrangeiro não se restringe à esfera profissional e, pouco a pouco, ele começa a influenciar Christian com seus ideais iluministas. A transformação imediata se vê no conselho, onde o rei até então fingia mandar e os demais membros fingiam respeitar - agora, o soberano impõe algumas de suas vontades até que elas sejam aceitas. 

A segunda interferência de Struensee é tão grave quanto: sua paixão pela literatura era o que bastava para acender uma outra paixão, desta vez pela rainha. Se os pensamentos de Voltaire são a inspiração necessária para tirar a Dinamarca da era das trevas, a ideia de que "o homem pode ser livre" também era o motivo que faltava para Caroline aspirar também seu direito à liberdade individual. Aprisionada num relacionamento de fachada, humilhada pelas traições do marido, longe de casa e constantemente angustiada com suas obrigações, ela vê no amante a possibilidade de alcançar uma felicidade até então desconhecida.


Da mesma forma em que estas questões se entrelaçam, este amor proibido não põe em risco só o casamento real. Ele também ameaça todas as conquistas do povo, já que muitos dos decretos em vigor que melhoravam as condições de vida dos camponeses, por exemplo, só foram aprovados graças à insistência do médico. É interessante notar, no entanto, que, embora imbuído das intenções mais nobre, o alemão toma gosto pelo poder a ponto de dispensar a autorização do rei para validar seus projetos. Metaforicamente, ele ocupa pela segunda vez o posto do rei: o primeiro foi a cama de sua mulher, em seguida, o trono.

Embora nunca seja apresentado efetivamente como um vilão - seus ideais são sempre nobres e suas decisões são tomadas unicamente em benefício do povo -, Struensee se vê numa posição delicada quando o escândalo vem à tona. A liberdade de expressão, benefício concedido durante a sua "administração", agora se volta contra ele e Caroline. E quando a pressão aumenta, ele é obrigado a rever os princípios que defendia com tanto ardor. 

A maneira como o filme de Nikolak Arcel articula as esferas pública e privada é o maior trunfo da produção, que também acerta nos quesitos técnicos, como fotografia, figurino e direção de arte. O que faltou foi um pouco de emoção na história, em especial entre os amantes. Ao personagem de Mikkelsen (que em breve encarna o protagonista da série Hannibal) só é permitido perder o controle durante um breve momento. Alicia se redime da atuação monótona apenas na cena em que é obrigada a se separar do filho. Já Mikkel tem espaço para brilhar na pele do monarca instável e imprevisível: louco ou apenas entediado? A ele, o benefício da dúvida.



No próximo post: Argo
Giselle de Almeida

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