Oscar 2015: Birdman


Indicações: filme, diretor, ator (Michael Keaton), ator coadjuvante (Edward Norton), atriz coadjuvante (Emma Stone), roteiro original, fotografia, edição de som e mixagem de som


Arrisco a dizer que todo ano o Oscar deveria ter o seu Birdman. Aliás, todo ano o cinema deveria ter o seu Birdman. É daqueles filmes que dividem opiniões - os que apreciam a ousadia e os que torcem o nariz para a proposta diferente. É daqueles filmes que provocam - na forma pouco usual, no conteúdo metalinguístico e crítico até o talo. É daqueles filmes que têm o que dizer mas, ao mesmo tempo, não se levam muito a sério. É daqueles filmes sobre o qual vamos falar sobre um bom tempo, enquanto outras dezenas (talvez até premiadas) cairão no esquecimento e na irrelevância. Pelo menos é o que eu espero.

Já na primeira cena, o longa de Alejandro González Iñárritu flerta com o surrealismo, ao mostrar o protagonista flutuando (de cueca, vejam bem) dentro de seu camarim. O estranhamento segue durante toda a projeção, enquanto nos perguntamos seriamente se Riggan (Michael Keaton) ouve vozes ou é mesmo capaz de conversar com Birdman, seu personagem mais famoso nos cinema (e seu alter ego nas horas vagas). 

Único papel de sucesso na carreira de um ator em decadência, o super-herói não surge impunemente na história neste momento em que as bilheterias dos Estados Unidos (e do resto do mundo, por que não?) só tem olhos para franquias adaptadas dos quadrinhos. A graça só aumenta por trazer Keaton no papel: intérprete do Homem-Morcego nos Batman de Tim Burton, ele não tem exatamente vários sucessos em sua carreira recentemente.

A busca pelo sucesso fácil, programa certo na agenda de produtores gananciosos e artistas preguiçosos, parece tão patética quanto o desespero do protagonista, que luta para montar um espetáculo e conseguir algum respeito dos críticos. Não que os críticos do filme sejam pessoas que mereçam qualquer credibilidade: são pessoas frustradas, impiedosas e arrogantes, você sabe. Todo o esforço de Riggan, no entanto, parece ser recompensado quando ele encontra Mike (Edward Norton), um ator motivado e talentoso de verdade. Mas eis que as palmas da platéia encontram outro dono e tudo vai por água abaixo, de novo. 

Acompanhar as idas e vindas emocionais e intelectuais dos personagens é um desafio, e a câmera sempre em movimento e a edição fluida do filme, quase um enorme plano sequência, nos dão a eterna sensação de percorrermos um enorme labirinto. A sensação de um tempo bem próximo do real aumenta a noção de urgência que permeia todo o filme: a peça vai estrear, o ator não vai aparecer, Riggan vai perder a sanidade, vai cometer um ato impensável. Iñárritu comanda com maestria o espectador por esses túneis que conectam ficção e realidade, vida íntima e vida pública, arte e show business.

O longa nos brinda com sequências hilárias como a que o protagonista percorre a Broadway de cueca e a briga entre Mike e Riggan; emocionantes como as francas conversas com a filha e a ex sobre o que a vida poderia ter sido e não foi; intrigantes como os confrontos entre Birdman e seu intérprete. Keaton está seguro em cena e entrega uma atuação sincera em todas as nuances do personagem, que entra em depressão com a mesma velocidade em que embarca numa egotrip. 

Norton está divertidíssimo como o artista meio sem noção meio sem escrúpulos, que não se importa em roubar a cena para garantir seu lugar ao sol. Os dois se destacam, mas Zach Galifianakis, Emma Stone e Naomi Watts seguram bem as pontas nos papéis secundários, dando consistência ao filme. O filme de Iñárritu talvez seja um sinal de que os astros de Hollywood precisem dar mais ouvidos para seus Birdmen interiores.

No próximo post: Boyhood
Giselle de Almeida

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